A lei, na maioria dos países ocidentais, declara: manifestar-se em defesa das práticas homossexuais é um direito de qualquer pessoa, no exercício da sua liberdade de pensamento e de expressão.
Por honestidade intelectual, no entanto, é oportuno acrescentar que cabe a cada manifestante apresentar argumentos sólidos para defender o seu ponto de vista: afinal, uma coisa é o direito a expressar-se e outra coisa é o direito alheio de não levar a sério quem não embasa razoavelmente as coisas que diz.
De fato, não faltam disparates, a favor ou contra qualquer assunto, amparados covardemente na muleta da “liberdade de expressão”, como se essa liberdade isentasse as pessoas da necessidade de alicerçar racionalmente as suas declarações e até as autorizasse a difamar, caluniar e, pura e simplesmente, mentir.
Como quer que seja, se a lei civil pretende ser coerente consigo mesma, então manifestar-se de forma crítica a respeito das práticas homossexuais também é um direito de qualquer pessoa, no exercício da sua liberdade de pensamento e de expressão – muito embora o politicamente correto negue, censure e às vezes até puna essas manifestações, confundindo a livre opinião sobre um tema com o crime de discriminação objetiva contra uma pessoa.
Obviamente, toda pessoa que deseja criticar quaisquer outras práticas tem o mesmo direito de fazê-lo, trate-se do celibato, do sexo livre, da virgindade, da promiscuidade, da heterossexualidade, da bissexualidade, do casamento, do divórcio, da poligamia, da fidelidade, do incesto, da pedofilia, da zoofilia… Tudo o que o ser humano faz é passível de ser comentado, questionado, elogiado ou criticado. De novo: a qualidade dos argumentos a favor ou contra o que quer que seja cabe a quem comenta. Não é porque existe a liberdade de expressão que qualquer coisa que alguém diga deva ser automaticamente merecedora de concordância generalizada.
É que existem argumentos sólidos e argumentos frouxos a favor e contra qualquer assunto. Quem afirma que Deus existe, por exemplo, saberá, se for intelectualmente honesto, que alguns argumentos em defesa da existência de Deus são inválidos em termos lógicos. Da mesma forma, o ateu intelectualmente honesto deverá saber que certos argumentos em defesa da inexistência de Deus também são inválidos em uma lógica rigorosa.
À pessoa intelectualmente séria, portanto, não basta argumentar qualquer coisa só porque essa “qualquer coisa” parece favorável à sua opinião. Um argumento estúpido pode ser um grande desfavor, ainda que supostamente esteja defendendo uma verdade. Quem pretende ser levado a sério e promover um diálogo sério deve saber distinguir entre argumentos válidos e meros disparates que em nada colaboram para um entendimento razoável entre seres humanos sensatos.
À pessoa intelectualmente séria, portanto, não basta argumentar qualquer coisa só porque essa “qualquer coisa” parece favorável à sua opinião. Um argumento estúpido pode ser um grande desfavor, ainda que supostamente esteja defendendo uma verdade. Quem pretende ser levado a sério e promover um diálogo sério deve saber distinguir entre argumentos válidos e meros disparates que em nada colaboram para um entendimento razoável entre seres humanos sensatos.
Feitas estas considerações, talvez possamos entrar com um pouco mais de discernimento na discussão do caso que o título deste artigo apresenta: o de alguns ativistas da chamada agenda LGBT que apelam para afirmações esdrúxulas sobre a suposta homossexualidade de Jesus Cristo, do apóstolo e evangelista São João e do rei Davi.
Esses ativistas observam, corretamente, que o Messias deu exemplo de tolerância e acolhimento ao compartilhar refeições com prostitutas, pecadores e publicanos. Até aqui, estamos falando de fatos documentados pelos próprios Evangelhos. No entanto, esses mesmos ativistas, sem apresentar fundamentação objetiva alguma, afirmam também que Jesus Cristo se mostrou “particularmente aberto à homossociabilidade ao revelar carinhosa predileção por João Evangelista”. Esta afirmação aparece em um panfleto intitulado “O que todo cristão deve saber sobre homossexualidade”, difundido desde a década de 1990 e já abordado por D. Estêvão Bettencourt, osb, em sua revista apologética “Pergunte e Responderemos”, número 389 (ano 1994, pág. 475). Essa interpretação subjetiva e tendenciosa da relação entre Jesus Cristo e São João Evangelista continua sendo encontrada em diversos fóruns, artigos, blogs e comentários em redes sociais até hoje.
Para D. Estêvão Bettencourt, a afirmação da “homossociabilidade de Jesus” chega a ser “irreverente ou blasfema”. O teólogo beneditino observa, em sua resposta na publicação mencionada, que Jesus teve discípulos masculinos porque os homens eram tidos como indicados para continuar a história dos doze Patriarcas do Antigo Testamento: a Igreja foi fundada sobre os doze Apóstolos (cf. Ap 21, 14), que representavam as doze tribos de Israel, cada qual encabeçada por um dos filhos de Jacó. De resto, a relação de Jesus com as pessoas de ambos os sexos é descrita nos Evangelhos como sendo uma relação de Mestre com seguidores, de Amigo com amigos, de Deus com suas criaturas amadas, de Salvador com pecadores, sem menção alguma a relacionamentos amorosos ou contextos eróticos. É verdade que tampouco há qualquer menção à inexistência de tais relacionamentos, o que é usado como desculpa para as incontáveis teses imaginativas sobre o suposto relacionamento de Jesus e Maria Madalena, por exemplo. No entanto, são especulações sem embasamento nem testemunho histórico algum. Se já é gratuito e infundado extrapolar que Jesus tenha mantido um relacionamento amoroso com Maria Madalena, insinuar que Ele tenha tido um relacionamento “homoafetivo” com São João Evangelista é, no mínimo, tão gratuito e infundado quanto. E nem é preciso entrar em méritos teológicos para contestar essas gratuidades: do mero ponto de vista histórico, não há base nenhuma para esse tipo de especulação.
Afirmações semelhantes também são disparadas sem qualquer seriedade a respeito do rei Davi, como se lê no mesmo panfleto: “Se o homossexualismo fosse prática tão condenável, como justificar a indiscutível relação homossexual existente entre o rei Davi e Jonatas? Eis a declaração do salmista para o seu bem-amado: ‘Jônatas, meu irmão, por tua causa meu coração me comprime! Tu me eras tão querido! Tua amizade me era mais preciosa que o amor das mulheres’ (2Sm 1,26)… Negar o amor homossexual entre estes dois importantes personagens bíblicos é negar a própria evidência dos fatos”, declara o folheto.
Repare-se no uso intelectualmente desonesto de termos como “indiscutível” e “evidência dos fatos” para forçar a suposta validade de uma argumentação que, na realidade, é perfeitamente discutível e não apresenta evidência alguma.
A interpretação gay do texto bíblico é enviesada e destituída de fundamento – que dirá “indiscutível”… O que o conjunto da narrativa bíblica aponta é que houve entre Davi e Jônatas a amizade de dois grandes companheiros de luta, interessados em apaziguar os ânimos do rei Saul: Davi era perseguido e Jônatas era seu protetor. Além disso, o texto bíblico é muito claro quando relata que Davi teve muitas mulheres, como, por exemplo, em 2Sam 5, 13-16: “À sua chegada de Hebron, tomou Davi ainda concubinas e mulheres em Jerusalém e nasceram-lhe filhos e filhas. Estes são os nomes dos filhos que lhe nasceram em Jerusalém: Samua, Sobab, Natã, Salomão, Jebaar, Elisau, Nafeg, Jáfia, Elisama, Baalida, Elifalet”. A passagem de 2Sm 16,21s também fala repetidamente das concubinas de Davi.
Como se estes fatos não bastassem, é emblemático o escândalo (e o grande pecado) em que Davi se envolveu quando se apoderou de Betsabeia, a mulher do general Urias: o rei chegou a matar Urias, expondo-o propositalmente, durante uma batalha, às invectivas do inimigo (cf. 2Sm 11,2-17). O texto sagrado dá a entender que Davi se apaixonou por aquela mulher casada e dela teve um filho, que morreu, e outro, que foi o rei Salomão. É este o tipo de comportamento sexual que caracteriza um homossexual?
Que esse tipo de hipótese gratuita faça parte do assim chamado “direito à liberdade de expressão” já é questionável em si mesmo, porque passa bastante longe de ser inquestionável o suposto “direito” de quem quer que seja a fazer afirmações falsas sobre alguém, mesmo que seja alguém já falecido há muitos e muitos séculos. Calúnia continua sendo calúnia (e toda calúnia diz mais sobre o caluniador do que sobre o caluniado).
Bem menos questionável deveria ser a obrigação à seriedade intelectual, que, sozinha, desmascara a fragilidade e a desonestidade desse tipo de fofoca desqualificada. O debate sério sobre os direitos de pensamento, expressão e liberdades individuais só tem a perder com apelações desse (baixo) nível.
via Aleteia
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